quarta-feira, 17 de junho de 2020

Música, Dança e Gestos



A Wicca atribui a diferença que percebemos entre o mundo físico e o não-físico às nossas limitações por sermos seres baseados em matéria. Alguns dos instrumentos utilizados na prática da religião são realmente não-físicos. Três dos mais eficazes dentre estes são a música, a dança e os gestos. Tais técnicas são utilizadas para gerar poder, alterar a consciência e comungar com a Deusa e com o Deus - para atingir o êxtase. Estas técnicas normalmente são parte integrante de rituais, e seguramente os ritos mais eficazes e poderosos podem utilizar apenas esses instrumentos. (Um ritual totalmente composto por gestos pode ser encontrado na Seção III: O Livro de Sombras das Pedras Erguidas.) A música e a dança estão entre os mais antigos atos religiosos e de magia. Nossos ancestrais provavelmente já se utilizavam da magia de sinais com as mãos e da postura corporal antes mesmo que a fala estivesse completamente desenvolvida. O simples gesto de apontar um dedo ainda possui fortes efeitos emocionais, desde a indicação de um réu como o culpado de um crime por uma testemunha até a seleção de um esperançoso candidato em um leilão cercado por um mar de concorrentes. A música é, tecnicamente, formada por ondas sonoras que podem ser mensuradas fisicamente. Entretanto, é impossível segurar a música com nossas mãos - apenas os instrumentos que a produzem. A primeira música foi provavelmente rítmica. Os humanos logo descobriram que podiam produzir ritmos e sons agradáveis ao bater em várias partes de seus corpos, notadamente as coxas e o peito. O bater de palmas cria um som distinto e claro, o qual ainda hoje é utilizado por Wiccanos para liberar o poder pessoal durante rituais de magia. Instrumentos rítmicos como tambores de troncos foram posteriormente utilizados para produzir sons mais encorpados. Algumas pedras ressoam quando batidas, e assim nasceu outro tipo de instrumento. Bambus, ossos e algumas conchas produzem sons silvantes quando assopradas da forma correta. Sistemas xamânicos ainda vigentes utilizam tais instrumentos. Rituais menos intelectualizados podem ser mais eficazes exatamente por evitar o consciente e falar diretamente à consciência profunda, psíquica. A música e a dança nos envolvem emocionalmente em ritos Wiccanos. A idéia de dançar, cantar ou tocar música intimida alguns de nós. Isto é o resultado natural de nossa sociedade cada vez mais repressiva. Na Wicca, entretanto, a dança e a música ocorrem somente perante as Deidades. Você não estará diante de uma platéia, portanto não se preocupe se desafinar ou pisar em seu próprio pé. Eles não se importam, e ninguém precisa saber o que você faz diante dos Deuses em seus ritos. Até mesmo pessoas sem a menor vocação musical são capazes de bater uma pedra contra outra, balançar um chocalho, bater palmas ou andar em círculos. Atualmente, alguns dos mais eficientes e reconhecidos covens se utilizam de uma simples corrida ao redor do altar para gerar poder. Chega de rituais ricamente coreografados. Eis a seguir um pouco de fatos tradicionais sobre dança, música e gestos. Se lhe interessar, sinta-se à vontade para incorporá-los a seus rituais Wiccanos. Apenas uma sugestão: se sentir que seus rituais estão muito austeros e pouco satisfatórios, se eles não criam uma ligação com as deidades, talvez o problema seja uma falta de conteúdo emocional. A música e a dança podem conferir um envolvimento genuíno ao ritual, abrindo assim sua percepção acerca da Deusa e do Deus. Durante a magia, podem criar acessos mais livres ã energia.
Música A música é simplesmente a reprodução dos sons da natureza. O vento nos galhos das árvores, o ribombar do oceano contra rochedos pontiagudos, o bater da chuva, o crepitar do fogo criado por um raio, o canto de pássaros e o rugir de animais são alguns dos “instrumentos” que criam a música da natureza. Há muito os seres humanos integraram a música a rituais religiosos e de magia, devido a seus efeitos poderosos. Os xamãs usam uma batida constante de tambor para induzir transe, e um tambor pode ser utilizado para controlar o ritmo de uma dança mágica. Além disso, há muito credita-se à música a capacidade de acalmar animais ferozes - assim como humanos. A Música pode ser parte das atividades da Wicca de hoje. Pode-se simplesmente encontrar peças adequadas, selecionadas da música clássica, étnica, folclórica ou contemporânea, para executá-las durante os rituais. Os Wiccanos com uma inclinação musical podem criá-la antes, durante ou após rituais. Meus rituais mais gratificantes e vívidos geralmente envolvem música. Lembro-me de um dia, quando ocultei um pequeno gravador atrás de uma árvore nas Montanhas Laguna. Estranhamente, a música não entrou em conflito com o cenário de flores silvestres, altos pinheiros e antigos carvalhos, mas sim enalteceu meu ritual solitário. Se possuir intimidade com algum instrumento, use-o em seus rituais. Uma flauta, um violino, uma flauta doce, um violão, uma harpa tradicional e outros instrumentos pequenos podem facilmente ser incluídos em rituais, assim como tambores, chocalhos, sinos ou mesmo copos de água a serem tocados com uma faca. Outros instrumentos menos portáteis podem ser gravados para serem reproduzidos durante o ritual. Tais interlúdios musicais podem ser utilizados imediatamente antes dos ritos para criar uma atmosfera; durante como uma oferenda à Deusa e ao Deus ou para gerar energia; e após como uma forma de celebração e prazer. Alguns Wiccanos compõem uma canção, a qual é em realidade um rito, incluindo nela desde a criação do espaço sagrado e a invocação das Deidades até o agradecimento por sua presença. A magia musical é aquilo que realmente se desejar fazer dela. Quatro tipos distintos de instrumentos possuem poderes específicos. O tambor, o chocalho, o xilofone e todos os instrumentos de percussão (com exceção do sistro) são regidos pelo elemento Terra. Portanto, tais instrumentos podem ser utilizados para invocar fertilidade, atrair dinheiro, encontrar um emprego e assim por diante. Podem também ser utilizados para evocar a Deusa em rituais, ou para reunir, “a toque de caixa”, a energia a ser enviada para a Terra. A flauta, transversal ou doce, assim como todos os instrumentos de sopro, estão sob a regência do Ar, o elemento do intelecto, e assim podem ser utilizados para aumentar os poderes mentais ou as habilidades de visualização, para descobrir sabedoria ou conhecimentos antigos, aumentar as faculdades psíquicas e atrair o Deus. O Fogo rege os instrumentos de corda tais como a lira, a harpa (grande ou folclórica), o violão, o bandolim, o ukelele e outros. Tais instrumentos podem ser utilizados em encantamentos ou ritos que envolvam sexualidade, saúde e força física, paixão e força de vontade, mudanças, evolução, coragem e destruição de hábitos nocivos. São também excelentes ferramentas a serem usadas antes dos rituais para purificar a área em questão, bem como o celebrante. Toque uma determinada canção, cante com o instrumento, ou simplesmente caminhe pela área num círculo no sentido horário até que o local esteja ecoando suas vibrações. As cordas também podem ser usadas para invocar o Deus. O metal ressonante, como os pratos, o sistro, o sino e o gongo, simbolizam o elemento da Água. Uma vez que a água engloba a cura, a fertilidade, a amizade, os poderes psíquicos, o amor espiritual, a beleza, a compaixão, a felicidade e outras energias similares, sinos, gongos ou pratos podem ser incluídos em tais ritos. O sistro de Ísis nos assegura que o metal ressonante invoca a Deusa. Encantamentos musicais (ao contrário dos puramente verbais) podem ser simples e eficazes. Precisa de dinheiro? Sente-se tranqüilamente vestido de verde e bata lentamente num tambor, visualizando-se rico enquanto invoca a Deusa em Seu aspecto de Fornecedora de Abundância. Se estiver deprimido, encontre um sino com um tom agradável e toque-o ritualmente, sentindo as vibrações do som eliminando sua depressão e elevando seu ânimo. Ou então carregue um pequeno sino consigo. Quando tiver medo, toque um violão ou ouça música de violões enquanto vê a si mesmo como alguém confiante e valente. Invoque o Deus em seu aspecto Chifrudo, agressivo, protetor. O canto, uma combinação de fala e música, pode ser prontamente integrado a rituais Wiccanos. Alguns Wiccanos adequam cantos e invocações a melodias, ou cantam quando assim o desejam durante rituais. Muitos Wiccanos nunca exploraram o assunto da magia musical, simplesmente reproduzindo música gravada como fundo para seus rituais. Nada de errado, mas integrar uma música criada por nós mesmos (não importa o quão simples seja) aos nossos rituais pode ser mais eficaz, desde que aprecie a peça. Atualmente, pode-se encontrar um grande número de fitas cassete Pagãs e de Wicca, ainda que sejam de qualidade variável. Algumas canções podem ser utilizadas em rituais, mas a maioria funciona melhor quando tocada durante os preparativos para o ritual, ou depois, como relaxamento. Incorporar a música apropriada aos rituais pode melhorar e muito a experiência Wiccana.
Dança A dança é certamente uma antiga prática ritual. É também um ato mágico, pois o movimento físico libera energia do corpo, a mesma energia utilizada em magia. Este “segredo” foi logo descoberto, e desta forma a dança foi incorporada em magia e rituais para gerar energia, alterar a consciência ou simplesmente honrar a Deusa e o Deus com performances rituais. Danças em grupo, como a dança espiral, são normalmente executadas em trabalhos de covens. Em trabalhos individuais, entretanto, não há limitações por tradição ou passos coreografados. Sinta-se livre para mover-se do modo que desejar, não importa o quão infantil ou “selvagem” possa parecer. Em magia, muitos Wiccanos praticam um pequeno encantamento ou manipulação ritual de alguma espécie (escrever runas, atar nós, desenhar figuras na areia ou em ervas em pó, entoando o nome de deidades) e em seguida praticam a verdadeira magia: gerar e canalizar a energia mágica. Em geral, eles movem-se num círculo no sentido horário, cada vez mais rápido, em torno do altar, seja solitariamente ou num coven, observando as velas acesas no altar, aspirando o incenso, liberando a si mesmos por meio de cantos e intensa visualização. Quando o praticante alcança um ponto sem retorno, no momento exato em que o corpo não pode mais gerar e canalizar energia, o poder é então liberado em direção ao objetivo mágico. Para tanto, alguns Wiccanos caem no solo, assinalando assim o final do que é peculiarmente conhecido como “A Dança”. A dança é utilizada para gerar energia assim como para facilitar a sintonia com as Deidades da natureza. Dance como o vento; como o riacho descendo a montanha, como as chamas de uma árvore atingida por um raio, como grãos de areia tocados durante uma rajada, como flores revelando seu brilho numa ensolarada tarde de verão. Enquanto dança, usando os movimentos que desejar, abra-se para a Deusa e para o Deus. Pense, por um instante, nos dervixes a girar, nas indomáveis danças ciganas da Europa, na sensual dança do ventre do Oriente Médio, na hula sagrada do antigo Havaí. A dança é um dos caminhos para o Divino.
Gestos Os gestos são o contraponto silencioso às palavras. Gestos podem fortalecer rituais Wiccanos quando praticados juntamente a invocações e danças, ou podem ser utilizados individualmente por seu verdadeiro poder. Apontar (como já mencionado), utilizar os dedos indicador e médio abertos formando um “v” e apresentar vulgarmente um dedo médio erguido demonstra a variedade de mensagens que podem ser enviadas pelos gestos, assim como a quantidade de respostas emocionais que eles suscitam. Em minha introdução à Wicca, alguns desses velhos gestos foram usados. Em 1971, vi algumas fotos de gestos protetivos como a mano figa (um punho fechado com o polegar entre o indicador e o médio) e a mano cornuta, um “v” formado pelo indicador e pelo mínimo, mostrados de cabeça para baixo. Há muito, ambos vêm sendo utilizados para afastar maus-olhados e negatividade, e o último é utilizado na Wicca, apontado para cima, para representar o Deus em seu aspecto Chifrudo. Alguns dias mais tarde, em meu primeiro ano de colegial, fiz esses dois gestos para uma garota que acabara de conhecer. Não havia nenhuma razão lógica para isso; apenas parecia o certo. Ela olhou para mim, sorriu e perguntou se eu era um bruxo. Eu disse que não, mas gostaria de ser. Ela passou a me treinar. O significado mágico dos gestos é complexo, e origina-se do poder das mãos. A mão pode curar ou matar, acariciar ou apunhalar. É um canal pelo qual as energias são enviadas do corpo ou recebidas de outros. Nossas mãos preparam altares mágicos, apanham bastões e athames e apagam as chamas das velas ao concluirmos ritos mágicos. Mãos, enquanto meios por meio dos quais a maioria de nós ganha a vida, simbolizam o mundo físico. Mas em seus cinco dedos reside o pentagrama, o supremo símbolo de proteção; a soma dos quatro elementos associada a Akhasha, o poder espiritual do universo. As linhas em nossas mãos podem, para o iniciado, ser utilizadas para acessar o inconsciente profundo e revelar coisas dificilmente captadas pelo consciente. O quiromante não interpreta essas linhas como ruas num mapa; são chaves para nossas almas, uma mandala de carne que revela nosso mais profundo interior. As mãos foram utilizadas como os primeiros instrumentos de cálculo. Acreditava-se que possuíam qualidades e simbolismo tanto masculino como feminino, e imagens de mãos são usadas ao redor do mundo como amuletos. Gestos em rituais Wiccanos podem facilmente tornar-se instintivos. Ao invocar a Deusa e o Deus, as mãos podem ser erguidas espalmadas para receber seu poder. A Deusa pode ser individualmente invocada com a mão esquerda, com o polegar e com o indicador erguidos em um semicírculo, enquanto o resto dos dedos se enrola sobre a palma. Este gesto representa a Lua crescente. O Deus é invocado com o indicador e com o médio erguidos, ou o indicador e o mínimo erguidos, enquanto o polegar segura os outros contra a palma, para representar chifres. Os elementos podem ser invocados com gestos individuais quando próximos das quatro direções: uma mão espalmada paralela ao chão para invocar a Terra no norte; uma mão erguida, com os dedos bem abertos, para invocar o Ar no leste; um punho erguido no sul para convidar o Fogo, e uma mão em concha no oeste para invocar a Água. Dois gestos, juntamente a posturas, vêm há muito sendo usados para invocar a Deusa e o Deus, e receberam seus nomes. Assume-se a posição da Deusa ao separar os pés cerca de 20cm, erguendo as mãos com as palmas voltadas para cima, os cotovelos levemente dobrados. Esta posição pode ser utilizada para chamar a Deusa ou para sintonizar-se com Suas energias. A posição do Deus consiste em manter os pés juntos no chão, o corpo rigidamente ereto, braços cruzados no peito (em geral o direito sobre o esquerdo), com as mãos fechadas em punhos. Instrumentos como o bastão e o punhal mágico (athame) podem eventualmente ser seguros nas mãos, ecoando a prática dos antigos faraós do Egito, que seguravam um cajado e um mangual de modo semelhante durante disputas. Nos covens, a Alta Sacerdotisa e o Grande Sacerdote costumam assumir tais posições quando invocam a Deusa e o Deus. Em trabalhos individuais, podem ser utilizadas para identificarmo-nos com os aspectos da Deusa e do Deus em nós, e também durante ritos invocatórios separados. Gestos também são utilizados em magia. Cada um dos dedos se relaciona a um planeta específico, assim como a uma antiga deidade. Uma vez que apontar é um ato mágico e é parte de muitos encantamentos, podemos escolher o dedo de acordo com seu simbolismo. O polegar está ligado a Vênus e ao planeta Terra. Júpiter (tanto o deus quanto o planeta) rege o indicador. O dedo médio é regido pelo deus e pelo planeta Saturno, o anelar pelo Sol e por Apolo e o mínimo pelo planeta Mercúrio assim como pelo deus que lhe dá nome. Muitos encantamentos envolvem o apontar, com os dedos de Júpiter e Saturno, normalmente para um objeto a ser carregado ou imbuído em energia mágica. Visualiza-se o poder partindo dos dedos direto para o objeto. Outros gestos rituais utilizados em ritos Wiccanos incluem o “cortar” de pentagramas nos quatro quartos ao desenhá-los no ar com o punhal mágico, o bastão ou o indicador. Isto é feito para, alternadamente, banir ou invocar os poderes elementais. É, obviamente, praticado com a visualização. A mão pode ser vista como um caldeirão, uma vez que pode conter água; um athame, pois é utilizada para dirigir energia de magia; e um bastão, por também poder invocar. Gestos são instrumentos mágicos tão poderosos como quaisquer outros, os quais podemos levar sempre conosco, para utilizá-los quando necessário.

    Capítulo 5 - Música, Dança e Gestos. Guia essencial da Bruxa Solitária, Scott Cunnigham.