Não é só de 8 festivais que vive um druida rs. Manter uma prática devocional diária é fundamental, ainda mais numa religião como a nossa em que procuramos honrar cada dia e momento com o devido respeito e alegria. Sim, porque a vida não é um fardo tampouco uma maldição para nós. A vida é um dom, um presente dos Deuses, e deve ser vivida da melhor e mais feliz forma. Se não der certo essa vez, a gente tenta em outra vida, em outras formas, quem sabe como uma águia, uma árvore, uma borboleta, ou como humano de novo.
Nos povos celtas, para cada ação existia uma oração. Oração para o despertar, para o dormir, para agradecer a refeição, para a colheita, para o trabalho, para o nascer e o pôr do sol, para a lua nova e tantas outras coisas. O Carmina Gadelica, um compêndio de preces e orações coletadas por Alexander Carmichael em vilas escocesas no século XIX, mostra essa forma de pensar e viver com certeza herdada dos celtas, apesar das influências cristãs contidas nas orações.
Falando agora sobre minha vivência, antes de dormir faço duas orações à Brighid agradecendo e pedindo para que eu tenha um bom sono e que minha casa seja abençoada e protegida. Uma dessas orações é:
Abençoe tu, oh Brighid, esta morada,
E todos que aqui dormem.
Abençoe tu, oh Brighid, os meus queridos,
No lugar onde eles descansam.
A noite que é essa noite,
E cada única noite.
O dia que é esse dia,
E cada único dia.
(Adaptação da oração 338 do Carmina Gadelica, Volume III).
Ao acordar faço a seguinte oração, baseada na “Moch Maidin” de Robert Kaucher.
Eu me levanto hoje
Com a graça dos deuses,
Que eu tenha a força de um touro,
A sabedoria de um salmão,
A valentia de um javali,
A beleza de uma borboleta,
O encanto de um cisne.
Que haja excelência sobre minha casa,
Excelência sobre meus amigos,
E excelência sobre minha parte do trabalho.
Assim seja.
Depois de lavar o rosto etc., dirijo-me ao altar e faço a seguinte prática:
Com água e fogo no altar, acendo uma chama (numa vela) dizendo:
Eu acenderei o fogo esta manhã
Na presença dos Deuses acima,
Na presença dos Ancestrais abaixo,
Na presença dos Nobres ao meu redor.
Coloco água de uma vasilha para outra dizendo:
Os três que estão na terra,
Os três que estão no céu,
Os três que estão no grande mar.
Molho os dedos (indicador, médio e anelar unidos) na água e toco a testa e bochechas dizendo:
Eu banho minha face em água pura,
Eu banho minha face nas águas da vida,
Que eu vá limpa por este dia.
Levanto a vela na altura dos olhos e digo:
Força para minhas mãos no trabalho,
Sabedoria em minha fala,
Amor em meu coração para todos,
E verdadeiro amor de todos para mim.
Seguro entre as mãos o pingente com a cruz de Brighid, que carrego em meu pescoço, e digo:
Haja agradecimento pelo meu despertar,
Haja agradecimento pelo meu levantar,
Haja agradecimento pelo meu viver,
E pela proteção que me cobre.
Faço então a oração de Brighid que adoro e/ou alguma outra prece que sinto vontade de proferir no momento. Depois disso, apago o fogo dizendo:
Em nome dos Antigos,
Em nome dos Nobres,
Em nome dos Deuses,
Que eu vá em frente na senda da virtude.
Libo a água derramando-a nos vasos de plantas e prossigo com as tarefas do dia.
(Prática elaborada pelo druida Marcílio Diniz, e pode ser lida na versão completa no site acima indicado).
Recentemente comecei a estudar o Ogham, então tem sido parte de minhas práticas diárias ler a cada começo do dia (geralmente após o café da manhã) sobre um determinado ogham. Ao almoçar e jantar eu agradeço pela comida, à Mãe Terra e ao animal que morreu para alimentar a mim e minha família. Ao tomar banho oro, ou apenas mentalizo, para que a água me purifique e renove minhas forças. Sempre que possível gosto de observar o pôr-do-sol pela janela de casa. E também gosto de olhar pro céu noturno quando está estrelado, com lua, sem lua ou carregado de nuvens de chuva.
Enfim, tenho tantas outras práticas que não são exatamente diárias (como fazer uma oração ao preparar um chá ou cantar para a lua cheia), mas que permeiam meu viver e enchem de magia e encanto meus dias. Confesso que não é todo dia que consigo realizar todas as práticas e preces diárias acima mencionadas, mas não consigo passar um dia sem ao menos fazer uma prece que seja. A prática devocional diária é uma coisa que deve ser construída e que também exige certa disciplina. Deixar de fazer as orações por preguiça é brincadeira né?! Seja o seu caminho o do(a) Druida(esa), Guerreiro(a) ou Devoto(a), manter uma prática diária é muito importante, pois isso faz com que sintamos o Druidismo em cada dia de nossas vidas, e não só em Beltane ou Samhain.
A prática diária deve ser realizada com um sentimento de honra e encantamento, não como uma obrigação. Se não, não faz sentido. Quando você conseguir realizar as práticas devocionais diárias sem se sentir obrigado a fazê-las, mas apenas porque gosta de realizar e sente que isso já faz parte de seu dia, então estará no caminho certo.
O EnCanto do Cisne